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Collor e Lindberg se cumprimentam na posse no Senado |
Carlos Fico
Rio de Janeiro
Um dos pontos turísticos de Brasília é um corredor, o “Túnel do Tempo”, passagem subterrânea que liga o plenário do Senado aos gabinetes dos senadores. Lá ficam expostos bustos e painéis retratando momentos da história do Brasil. O espaço, recentemente, passou por uma reforma e os antigos painéis foram refeitos. Um deles sumiu: o que assinalava o impeachment do ex-presidente (e hoje senador) Fernando Collor de Mello.
Questionado sobre o motivo da retirada do painel, José Sarney, presidente do Senado, disse que o afastamento de Collor não tinha grande importância: “Eu não posso censurar os historiadores que foram encarregados de fazer a história. Mas acho que talvez esse episódio seja apenas um acidente que não devia ter acontecido na história do Brasil”. Para ele, os fatos que marcaram o impeachment não foram importantes e “de certo modo não deveriam ter acontecido”.
Seria interessante se pudéssemos eliminar alguns dos piores momentos da história do Brasil. Entre os mais recentes, eu escolheria pelo menos dois (ambos envolvem o Senado): a declaração de vacância da presidência da República, em 1964, feita pelo presidente do Senado, Auro de Moura Andrade, quando Goulart ainda estava no país – espécie de versão parlamentar do golpe – e a posse do senador Sarney como presidente da República, em 1985, que inaugurou um dos governos mais desastrados da história do Brasil recente. Há muitos outros momentos: o leitor pode colaborar indicando suas preferências.
Entretanto, não é possível eliminar o passado. A retirada do painel certamente decorre do desconforto causado pela presença de Collor no Senado, justamente a casa que o puniu em 1992 suspendendo seus direitos políticos (Collor renunciou momentos antes da votação do impeachment).
Esse “desconforto” assumiu um ar burlesco quando o jovem senador pelo Rio de Janeiro, Lindberg Farias, cumprimentou Collor pela primeira vez no plenário do Senado durante a cerimônia de posse em fevereiro passado. Como se sabe, Lindberg tornou-se conhecido justamente por ter liderado, como “cara-pintada”, a campanha para afastar Collor.
Apesar de mais esse ato equivocado de José Sarney, o afastamento de Collor jamais será esquecido. O episódio foi importante porque demonstrou a indignação brasileira com a corrupção. Mais importante ainda, sinalizou que a democracia brasileira estava suficientemente forte – apesar dos 21 anos de regime militar – para suportar, sem maiores sobressaltos, a deposição constitucional do primeiro presidente da República eleito diretamente desde a eleição de Jânio Quadros em 1960.